Os perigos da superficialidade virtual
Você já parou para pensar quantas vezes por dia interrompe alguma atividade que está executando para verificar as notificações das suas redes sociais? E, destas vezes, quantas informações superficiais ou desnecessárias acabou acessando?
De acordo com um estudo publicado pelo consultor em gestão do tempo Christian Barbosa, feita com 4000 pessoas, publicada em sua obra Equilíbrio e Resultado – Por que as pessoas não fazem o que deveriam fazer?, 62% dos internautas admitem que navegar na internet faz com que elas procrastinem, adiem tarefas pessoais e profissionais.
Diante do excesso de informações virtuais, e com recursos como a barra de rolagem das redes, que nos permite ver conteúdos infinitamente, é quase impossível permanecer pouco tempo conectado e absorver todo esse boom digital informacional. Um outro estudo chamado Papo Digital da empresa Hello, ressalta que sete em cada dez brasileiros usam as redes sociais para se informar. No entanto, o nosso cérebro não consegue armazenar todas as informações.
Em entrevista para a revista Superinteressante, o psicólogo Orlando Bueno, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), afirma que há dois tipos principais de memória: uma de curto prazo, que armazena de seis a sete itens como número de telefone, por pouco tempo, e outra de longo prazo, que registra dados mais importantes que necessitam ser sempre lembrados. A questão é que, no mundo virtual, não conseguimos nos aprofundar nos assuntos apresentados por tempo suficiente e assim acabamos construindo visões superficiais daquilo a que temos acesso.
O mesmo acontece do outro lado, afinal, muitos conteúdos propagados também apresentam uma visão superficial e tendenciosa de determinado assunto com o único intuito de influenciar o público. Desta forma, se não buscamos outras fontes para checar a veracidade das informações, somos influenciados pela superficialidade virtual. Além disso, há outro fator essencial na absorção supérflua de conteúdos veiculados na internet: a nossa visão de mundo, que condiciona a mensagem de acordo com o que queremos acreditar.
Para compreender melhor o assunto, podemos recorrer à Teoria do Conhecimento do filósofo e teólogo alemão Johannes Hessen (1889-1971) que descrevia três elementos fundamentais para a constituição do conhecimento: a consciência do sujeito conhecedor, o objeto a ser conhecido e a relação que se estabelece entre ambos. De acordo com Hessen, o sujeito conhece o objeto a partir de sua percepção sobre ele. Ou seja, trata-se da interação entre o objeto e a formação mental do indivíduo que o percebe, moldada por suas características psicológicas e sociológicas. Uma mesma mensagem, então, pode gerar múltiplas interpretações, pois esta se relacionará com múltiplas consciências para que o conhecimento se concretize.
Mas, num ambiente virtual, onde, frequentemente, não conseguimos filtrar as informações, a tendência é condicioná-las, cada vez mais, às nossas crenças, distorcendo, muitas vezes, o conteúdo e nos isolando em bolhas. Afinal, é preciso sempre questionar, pesquisar e analisar opiniões contraditórias para que compreendamos cada uma antes de tomarmos decisões precipitadas. Do contrário, as redes seguirão tomadas por discursos vazios, contaminados por ódio, intolerância e preconceitos.
Portanto, a dica é não se ater à superficialidade das redes sociais, mas pesquisar, analisar fontes diversas e refletir sobre os assuntos vistos, desenvolvendo assim a nossa criticidade, pois é muito mais válido o conhecimento profundo de poucos temas do que a visão distorcida e simplória de uma infinidade de conteúdos explodida nas redes. Assim, não procrastinaríamos tanto no espaço virtual ao tentar saber de tudo e não absorver quase nada. O filósofo grego Epíteto destacou em sua obra The Enchiridion (135 A.C) que o ser humano não é afetado pelas coisas em si, mas sim pelo modo como as percebe. Que possamos, então, aprimorar nossa mente para ampliar essa percepção.
Mariana Mascarenhas
Mariana da Cruz Mascarenhas é Jornalista e Mestra em Ciências Humanas.
Atua como Assessora de Comunicação e como Articulista de Mídias Sociais, economia e cultura.
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