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O Papa: Deus não tem medo de tocar as feridas da nossa carne

O Papa Francisco conduziu a celebração penitencial na Paróquia de Santa Maria delle Grazie, no Bairro Trionfale, em Roma, na tarde desta sexta-feira (17/03), no âmbito da iniciativa quaresmal de oração e reconciliação “24 horas para o Senhor”.

Francisco iniciou sua homilia, citando um trecho do Apóstolo Paulo da Carta aos Filipenses: «Por causa de Cristo, porém, tudo o que eu considerava como lucro, agora considero como perda».

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Salvar as aparências e não dar lugar a Deus

“Se nos perguntarmos quais são as coisas que ele deixou de considerar fundamentais na sua vida, feliz até por as perder para encontrar Cristo, percebemos que não se trata de realidades materiais, mas de «riquezas religiosas». É assim mesmo: era um homem devoto e zeloso, um fariseu fiel e observante. No entanto, estes hábitos religiosos, que podiam constituir um mérito, uma ostentação, uma riqueza sacra, na realidade eram um impedimento. E então Paulo declara: «Tudo perdi e considero esterco, a fim de ganhar a Cristo»”, disse o Papa.

Quem se sente demasiado rico de si e da sua probidade religiosa presume-se justo e melhor do que os outros, contenta-se em salvar as aparências; considera-se satisfeito, mas assim não pode dar lugar a Deus, porque não sente necessidade d’Ele. Ocupou o lugar de Deus com o seu «eu» e então, ainda que recite orações e realize atos de piedade, verdadeiramente não dialoga com o Senhor.

O fariseu e o publicano

Depois, Jesus nos dá um ensinamento na parábola do fariseu e do publicano. “Ambos vão ao templo para rezar, mas só um chega ao coração de Deus. Mais do que os gestos que fazem, fala a sua postura física: o Evangelho diz que o fariseu rezava «de pé», enquanto o publicano, «mantendo-se à distância, nem sequer ousava levantar os olhos ao céu»“. E o Papa refletiu sobre estas duas posturas.

“O fariseu está de pé. Está seguro de si, aprumado e triunfante como alguém que deve ser admirado pela sua probidade. Nesta atitude, reza a Deus, mas na realidade celebra-se a si mesmo: eu frequento o templo, eu observo os preceitos, eu dou esmolas… Formalmente, a sua oração é impecável, exteriormente vê-se um homem piedoso e devoto, mas, em vez de se abrir a Deus levando-Lhe a verdade do coração, esconde hipocritamente as suas fraquezas“, disse Francisco.

“O publicano, por sua vez, mantém-se à distância. Não procura abrir caminho; fica ao fundo. Mas é precisamente esta distância, expressão do seu ser de pecador diante da santidade de Deus, que lhe permite experimentar o abraço bendito e misericordioso do Pai. Deus pode alcançá-lo, porque aquele homem Lhe deixou espaço, permanecendo à distância. Oh! Como isto é verdade também nas nossas relações familiares, sociais e mesmo eclesiais! Há verdadeiro diálogo, quando sabemos preservar um espaço entre nós e os outros, um espaço salutar que permite a cada um respirar sem ser absorvido ou aniquilado. Então aquele diálogo, aquele encontro, pode encurtar a distância e criar proximidade”, sublinhou o Papa.

Deus nos espera no fundo

Irmãos, irmãs, lembremo-nos disto: o Senhor vem a nós, quando nos distanciamos do nosso eu presunçoso. Ele pode encurtar as distâncias conosco quando, com honestidade e sem fingimento, lhe trazemos a nossa fragilidade. Estende a mão para nos levantar, quando percebemos de «tocar o fundo» e entregamo-nos a Ele na sinceridade do coração. Deus nos espera no fundo, porque não tem medo de descer dentro dos abismos em que caímos, tocar as feridas da nossa carne, acolher a nossa pobreza, os fracassos da vida, os erros que cometemos por fraqueza ou negligência. Deus nos espera ali, nos espera especialmente no sacramento da Confissão.

A seguir, o Papa convidou a fazer “um exame de consciência, porque tanto o fariseu quanto o publicano habitam dentro de nós. Não nos escondamos atrás da hipocrisia das aparências, mas entreguemos com confiança à misericórdia do Senhor as nossas opacidades, os nossos erros, as nossas misérias. Quando nos confessamos, colocamo-nos ao fundo como o publicano, para reconhecermos, também nós, a distância que nos separa entre aquilo que Deus sonhou para a nossa vida e o que realmente somos no dia a dia”.

Francisco nos convidou, neste tempo quaresmal, com o coração contrito, a sussurrar como o publicano: «Ó Deus, tem piedade de mim, que sou pecador».

“Quando me esqueço de Ti ou Te transcuro, quando anteponho as minhas palavras e as do mundo à tua Palavra, quando presumo ser justo e desprezo os outros, quando murmuro dos outros, quando não cuido de quem está ao meu lado, quando me mostro indiferente a quem é pobre e atribulado, frágil ou marginalizado, pelos pecados contra a vida, pelo mau testemunho que mancha o belo rosto da Mãe Igreja, pelos pecados contra a criação, pelas minhas falsidades, as minhas desonestidades, a minha falta de transparência e integridade, pelos meus pecados ocultos, pelo mal que – mesmo sem me dar conta – fiz aos outros, pelo bem que poderia ter feito e não fiz”, concluiu.

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