Ano Novo: Juntar os cacos para compor um belo vitral
Há poucos dias, iniciamos 2020. Um ano como outros. Bem, este tem um dia a mais: estamos em um ano bissexto… De qualquer forma, mais um ano… Excluindo nossas medições temporais, são dias que transcorrem como os demais, sem nenhuma aura mágica. Todavia, temos uma profunda necessidade de marcar o tempo para nos organizarmos no desenrolar de nossa existência. Assim, faz todo sentido afirmarmos que estamos, de fato, em um ano novo.
Esta passagem nos ajuda a refletir como tem sido nossa atuação até aqui e o que nos desafia à mudança, sem superficialismos. Não se trata de votos vazios, mas, de uma reflexão atenta à responsabilidade que temos em relação à nossa própria vida, tanto pessoal quanto social. Mais do que desejar um feliz ano novo, há que se empenhar num trabalho de renovação interior, dado que as estruturas externas sofrem mudanças apenas quando há transformações internas. Para que o ano seja realmente novo, eu preciso me fazer novo. No fundo, todos precisamos de renovação constante.
Um bom começo é avaliar aquilo que não deu certo, que não rendeu frutos e, pior, que tenha prejudicado alguém. Penso, por exemplo, na noção de limite que devemos ter quando nos expressamos. Que fique bem dito: não podemos abrir mão de uma sociedade democrática na qual reine a liberdade de expressão. No entanto, liberdade de expressão que prescinde do respeito perde seu fundamento e, em vez de contribuir para algo bom, acaba por causar estragos. Liberdade de expressão não significa autorização para ofender; significa, pois, liberdade para colocar-se diante do outro, expondo-lhe uma determinada visão de mundo, partindo do pressuposto de que o outro tem o mesmo direito. Isso me faz lembrar do célebre ensinamento de Jesus: “Tudo, pois, quanto quereis que os outros vos façam, fazei-o, vós também, a eles” (Mt 7,12). Ninguém gosta de ser ofendido, logo, que tal medir as palavras e conter os gestos? Que falta nos faz, muitas vezes, colocar-se no lugar do outro.
Estamos, uma vez mais, diante de uma oportunidade de recomeço. Para alguns, talvez o último ano tenha sido difícil por questões diversas. Às vezes, depois de certa jornada nos sentimos como que em cacos. Recordo-me, porém, do feliz título que Adélia Prado deu para uma de suas obras: Cacos para um vitral. Inspirador! Se porventura alguém estiver se sentindo em cacos, então, que não deixe passar a ocasião propícia para compor um belo vitral. Para um ano novo, novas atitudes. Abençoado 2020!
.
Pe. Éverton Machado dos Santos
Pároco da Paróquia São João Batista, em Jacareí.
.
.
.
.
.
.
.
.
Texto ótimo!