A encíclica Pacem in Terris
Esta encíclica é considerada sui generis na Doutrina social da Igreja por vários aspectos. Primeiro, por ser destinada não somente ad intra eclesiam, mas a todas pessoas de boa vontade; segundo, por não ser comemorativa da Rerum Novarum, como era tradição nos documentos anteriores; terceiro, porque se afasta da chamada “questão operária” e abre um novo campo de discussão, a partir da preocupação com a construção da paz entre as nações; finalmente, porque introduz na doutrina social uma aproximação indutiva aos problemas sociais, caracterizando uma nova metodologia.
Coerente com esses aspectos inovadores, a Pacem in Terris acentua a colaboração com outras pessoas na ação social, para além dos quadros da Igreja Católica e dos cristãos em geral (n. 156). Isso abre o leque de parcerias na ação política.
Um chamado à ação
A Pacem in Terris oferece em seu 5ª capítulo algumas Diretrizes Pastorais, sendo seu ponto de partida o dever que os cristãos têm de participar ativamente da vida social. Para isso, não basta somente uma fé inquebrantável e boas intenções, mas é necessário se inserir nas estruturas para transformá-las a partir de dentro. Esse vivo chamado do Papa à ação sociopolítica reflete uma a dimensão prática da Doutrina social da Igreja, que não é e nem pode ser somente uma teoria, mas deve motivar um engajamento sociopolítico transformador. Esse compromisso social pode ser realizado inclusive com aqueles que não compartilham da fé cristã, mas que, como nós, querem um mundo mais justo, fraterno e igualitário.
O ponto de partida do argumento de João XXIII para esse “ecumenismo social” é a distinção entre o “erro” e a “pessoa que errou”. Essa última conserva sempre a sua dignidade e tem sempre a capacidade superar seu erro, por causa de uma capacidade natural para se abrir ao conhecimento da verdade. Nesse sentido, os crentes podem oferecer aos que não creem ou aos que erraram em um ou outro modo, um exemplo e testemunho para que esses cheguem ao conhecimento da verdade.
O Pontífice distingue entre as “ideologias”, que têm princípios que se opõe à fé cristã, e os “movimento históricos” originados delas, que por vezes vão se distanciando da ideologia que, em si mesma, é fixa e imutável, de modo que se aproximam daquilo que todos auspiciamos. Se esses movimentos estão de acordo com a reta razão e interpretam as justas aspirações humanas, então têm elementos positivos e dignos de aprovação (n. 156-159).
A formação social da juventude
Constata o Pontífice que nos países com forte tradição cristã florescem as instituições de ordem temporal, com marcante competência científica e técnica. No entanto, a inspiração cristã está ausente dessas instâncias. De acordo com João XXIII o motivo é duplo: a ruptura entre fé e atividade profissional e a falta de uma sólida formação cristã.
Em vista disso, propõe o Papa que a formação da juventude deva ser integral, isto é, contemplar a dimensão científica e técnica, mas sem esquecer as obrigações morais correspondentes à realidade social (n. 150-151). Essa indicação é importante e deveria estar contemplada na matriz curricular e ementas das Escolas, Faculdades e Universidades Católicas, onde se formam profissionais para o mercado de trabalho nas mais variadas áreas. Daí verdadeiramente esses seriam, em seus respectivos ambientes profissionais, sal da terra e luz do mundo.
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Padre Antonio Aparecido Alves
Mestre em Ciências Sociais com especialização em Doutrina Social da Igreja pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma e Doutor em Teologia pela PUC-Rio. Professor na Faculdade Católica-SJC e Pároco na Paróquia São Benedito, no Alto da Ponte em São José dos Campos.