Evangelho e tortura, uma combinação impossível!
Nós, cristãos, professamos que Jesus de Nazaré é o Cristo Salvador. Seu testemunho chegou até nós através de uma comunidade de fé que guardou sua memória, inclusive, registrando-a em escritos que denominamos evangelhos. Todos eles – são quatro – afirmam que, além de ter sido brutalmente assassinado, Jesus foi torturado física e psicologicamente (Mc 14,65; 15,16-20.20-32a; Mt 26,67-68; 27,27-31.39-44; Lc 22,63-65; 23,35-37; Jo 19,1-3). A morte de Jesus, ao contrário do que muitos pensam, não foi fruto do acaso, tampouco vontade de uma divindade que necessitava satisfazer um desejo, convenhamos, macabro. A morte do Mestre de Nazaré foi minuciosamente arquitetada a partir do momento em que Ele começou a colocar o dedo na ferida (Mc 14,1; Mt 12,14; 26,3-4; Lc 22,2; Jo 5,18; 11,53). Tudo começou como uma rixa ideológica e terminou como uma ordem do Estado, no caso, o Império Romano.
Jesus nos revelou o Deus da vida (cf. Lc 20,38) e manifestou que sua missão é nos conceder vida em abundância (cf. Jo 10,10). Logo, é missão dos cristãos – seguidores do Cristo – promover a vida de forma integral. Isso significa que, para os discípulos de Jesus, a tortura constitui um pecado gravíssimo! Trata-se de um crime para o qual não há justificativas.
Contemplamos com assombro por esses dias – mas também já há algum tempo – discursos que fazem apologia à tortura e enaltecem torturadores. Muito mais do que falta de bom senso, sobram neste tipo de atitude desprezível o preconceito, a crueldade e, claro, a motivação ideológica que passa longe da fundamentação e do discurso razoável. Infelizmente, não há novidade no fato de existirem pessoas comprometidas com esses discursos, porém, o que gera preocupação é uma boa quantidade de cristãos assinar em baixo e bater palmas para algo que é, escancaradamente, contrário aos valores evangélicos.
Que a fé genuína em Jesus Cristo, que foi injustiçado, torturado e morto exatamente por defender a vida das pessoas, nos leve a uma profunda conversão e revisão dos nossos valores, para nos livrar das cegueiras que nos impedem de participar de uma sociedade mais justa e fraterna. Que cada cristão, longe das amarras ideológicas de todos os matizes e em comunhão com o Evangelho, opte a partir das mínimas coisas pela vida, que é dom de Deus; abrace com paixão aquilo que contribuirá para o bem das pessoas, a começar por discursos respeitosos e responsáveis; se comporte de tal modo que suas boas ações encham de esperança aqueles ao seu redor. Que ressoe sempre em nossos corações aquele imperativo que nos indica um caminho certeiro de realização: “escolhe, pois, a vida” (Dt 30,19).
Padre Éverton Machado dos Santos
Pároco da Paróquia São João Batista em Jacareí
.
.
.
.
.
.
.
.
.