A Igreja e a Paz
A paz é um desejo profundo de todos. À causa da paz muitas pessoas dedicaram grande parte de sua vida, trabalhando em projetos que a promoviam entre os povos, ou então como educadores, para construir uma cultura de paz, ou ainda saindo pelas ruas de maneira não-violenta para exigi-la. A Igreja Católica, com o Papa Paulo VI em 1967, consagrou o primeiro dia do ano civil (1º de janeiro) como “Dia da Paz” e a pedido do mesmo Papa, a ONU determinou que esse fosse o dia da “Confraternização Universal”.
Normalmente as pessoas entendem a paz negativamente, isto é, como ausência de guerra. Porém, este não é o seu sentido pleno. Ela pode ser também entendida positivamente, no sentido de se afirmar o que deve haver, ao invés de mostrar o que não deve haver. Partindo disto, a UNESCO afirmou que a paz não pode consistir somente em ausência de conflito armado, mas implica principalmente um processo de progresso, justiça e respeito recíproco entre os povos, que assegure a construção de uma sociedade internacional, na qual todos possam encontrar seu lugar e viver bem.
Na Bíblia, a palavra hebraica shalom foi traduzida para o grego como eirênê e depois para o latim como pax e daí para as diversas línguas modernas. No entanto, essas traduções não coincidem perfeitamente com o significado do termo hebraico que, aplicado à vida em sociedade, é muito mais que ausência de conflitos. A palavra shalom diz que se está socialmente em ordem quando a justiça é praticada e todos vivem em felicidade, com o necessário para o seu bem-estar. Por isso, ela está sempre associada à tsedaqâ, justiça.
Em vista do momento em que vivemos, faz-se necessário apostar na construção da paz. Antes de tudo é preciso admitir que vivemos em uma sociedade onde estão presentes os mais diversos tipos de conflitos, a começar dos mais simples, tais como diferentes pontos de vista e de gosto, até os macrossociais, envolvendo grupos, países e continentes. Não se pode, no entanto, deixar que os conflitos se transformem em confrontos e daí a busca de administrá-los de maneira pacífica, buscando a justiça.
O Papa Francisco, na Mensagem para este 50º Dia da Paz, convida para a não-violência, que é ativa enquanto constrói a paz, não pagando a agressão e violência com a mesma moeda. Na mensagem, o Pontífice lembra dois ícones da não-violência: Mahatma Gandhi e Martin Luther King. O primeiro libertou a Índia do domínio inglês, enquanto o segundo conseguiu derrubar a segregação racial nos Estados Unidos. Acreditar na força da paz, resolver pacificamente os conflitos para que eles não se tornem confronto, é o caminho que nos é proposto.
Crer na Paz significa professar que ela só pode ser obtida por meios pacíficos. Como Santo Agostinho, queremos afirmar a superioridade do verbum (diálogo) sobre o ferrum (espada). Ao contrário do filósofo Thomas Hobbes, que afirmou ser o homem um lobo do outro homem, a ética social cristã prega a natural sociabilidade humana. Santo Tomas de Aquino afirmou que os seres humanos foram criados para viverem em sociedade, não como feras, mas como amigos, em uma espécie de amizade cívica, reinterpretando o que dissera Aristóteles na obra “Ética a Nicômaco”. Cremos, por isso, que o ser humano pode ser educado para a paz, pois essa lhe é natural. O ser humano não foi feito para a guerra. Para fazê-la, ele precisa ser treinado. Não têm garras e defesas naturais como os outros animais. Matar não é natural ao ser humano.
A causa da paz merece que acreditemos nela. É preciso apostar e educar para ela, investindo na índole pacifica do ser humano. Sobretudo nós, cristãos, cremos na paz, porque somos seguidores do Príncipe da Paz (Ef 2,14-17) e a recebemos como um dom. No entanto, para nós, viver em paz não é somente um dom, mas também uma tarefa. E se ela fracassar no mundo, que não seja por nossa culpa.
Pe. Antonio Aparecido Alves
Mestre em Ciências Sociais e Doutor e Teologia